Às vezes uma máxima carrega este título porque ela é remexida o máximo possível. O pastor de ovelhas da literatura russa Leon Tolstói disse: Se queres ser universal, cante sua aldeia. Aqui o lembrete ganha uma virada de trezentos e sessenta graus para analisarmos o lado oposto. O Swinging London, festinha de república metida a movimentação artística, onde a moçada londrina queria as ruas para desfilar as três graças da época --- rock, minissaia e anticoncepcional --- ganhou no cinema, tanto na figura do divulgador quanto na do estraga-prazeres, homens de outras nacionalidades. O italiano Michelangelo Antonioni ficou sendo o promoter indireto devido o grafismo levemente psicodélico de “Blow-up” (1967). O polonês Jerzy Skolimowisky arranhou o disco na vitrola e lançou um atualismo, não vindo das bandas de então, mas do comportamento pretendido, com seu divertido e grotesco “Ato Final” (Deep End).
Não se vê em nenhum momento a iconografia ingênua da Swinging London: a quase nudez esquálida e diáfana de moças de vestido curto de bandas eletrificadas tocando como se a brisa fosse o empresário. A silhueta da personagem de Jane Asher é bem torneada, lembrando uma Barbarella da baixa gastronomia noturna. Toda a longa sequência em que Sean B. Weske espreita sua paixão, até descobrir que a mesma é uma stripper, tem sabor de odisséia amalucada com uma fauna multi-facetada que só mesmo Londres poderia abarcar. Nesta, incluem-se desde a prostituta matrona de perna engessada até o chinês vendedor de cachorros-quente. Coroando estas vinte e mil léguas submarinas pelos inferninhos afora, vemos o jovem segurando a reprodução em placa do contorno da atração principal da noite, para depois cair nu na piscina com sua parceira de madeira, misto de mulher e prancha de surf.
Numa época em que os coveiros das aberturas de cinema estavam começando a se aposentar, Skolimowisky cria segundos brilhantes no início, quando a câmera, após centrar uma gota de sangue, desliza ante o quadro da bicicleta do protagonista. O fundo berrante do filtro vermelho deixa a ferrugem do veículo quase com a aparência de desenho, lembrando o estupendo Saul Bass, responsável por grandes inícios, como o de “Um Corpo que Cai” (1958), verdadeira tapeçaria moderna em movimento. Espécie de câmera de bolso, que de tão próxima, não nos revela de imediato a coisa filmada.
Vindo da aclamada escola de cinema de Lodz, Skolimowisky, assim como outro conterrâneo seu, Roman Polanski, carrega maleta imaginativa cheia de bugigangas sórdidas. Humor nervoso que brota de um potente olhar sobre o desejo humano; lances insólitos e soltos de enquadramentos; o clima enervante que acaba desaguando num comentário peralta sobre a atmosfera do cinema noir. Tudo isso para quebrar a espinha da ilusão do que se acreditava relegado na lata do lixo da História pela ação da juventude da época, o sentimento de posse do corpo do outro. O adolescente fica em brasa com a companheira de trabalho, exigindo uma exclusividade de lua-de-mel feudal. O amor livre está a léguas de distância.
Não se vê em nenhum momento a iconografia ingênua da Swinging London: a quase nudez esquálida e diáfana de moças de vestido curto de bandas eletrificadas tocando como se a brisa fosse o empresário. A silhueta da personagem de Jane Asher é bem torneada, lembrando uma Barbarella da baixa gastronomia noturna. Toda a longa sequência em que Sean B. Weske espreita sua paixão, até descobrir que a mesma é uma stripper, tem sabor de odisséia amalucada com uma fauna multi-facetada que só mesmo Londres poderia abarcar. Nesta, incluem-se desde a prostituta matrona de perna engessada até o chinês vendedor de cachorros-quente. Coroando estas vinte e mil léguas submarinas pelos inferninhos afora, vemos o jovem segurando a reprodução em placa do contorno da atração principal da noite, para depois cair nu na piscina com sua parceira de madeira, misto de mulher e prancha de surf.
Numa época em que os coveiros das aberturas de cinema estavam começando a se aposentar, Skolimowisky cria segundos brilhantes no início, quando a câmera, após centrar uma gota de sangue, desliza ante o quadro da bicicleta do protagonista. O fundo berrante do filtro vermelho deixa a ferrugem do veículo quase com a aparência de desenho, lembrando o estupendo Saul Bass, responsável por grandes inícios, como o de “Um Corpo que Cai” (1958), verdadeira tapeçaria moderna em movimento. Espécie de câmera de bolso, que de tão próxima, não nos revela de imediato a coisa filmada.
Jerzy Skolimowsky, mestre do cinema polonês |
Vindo da aclamada escola de cinema de Lodz, Skolimowisky, assim como outro conterrâneo seu, Roman Polanski, carrega maleta imaginativa cheia de bugigangas sórdidas. Humor nervoso que brota de um potente olhar sobre o desejo humano; lances insólitos e soltos de enquadramentos; o clima enervante que acaba desaguando num comentário peralta sobre a atmosfera do cinema noir. Tudo isso para quebrar a espinha da ilusão do que se acreditava relegado na lata do lixo da História pela ação da juventude da época, o sentimento de posse do corpo do outro. O adolescente fica em brasa com a companheira de trabalho, exigindo uma exclusividade de lua-de-mel feudal. O amor livre está a léguas de distância.
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